A educação no Estado do Rio de Janeiro como está? O ensino nas escolas públicas deixa a desejar em comparação aos colégios particulares? Essas e outras perguntas fazem parte da entrevista “ping- pong” que o ex secretário estadual de Educação Comte Bittencourt concedeu ao GBNEWS Impresso que foi recebido pelo professor Comte Bittencourt que sempre teve seu nome ligado à Educação. Foi deputado estadual por quatro mandatos consecutivos, presidiu a Comissão de Educação da Alerj; autor de mais de 30 leis sobre o tema e é ex-secretário estadual da pasta, no Rio de Janeiro.
GBNEWS – Como o senhor analisa o desempenho do sistema escolar público e privado a partir da pandemia?
Comte Bittencourt – Ao analisar os dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), sobre os efeitos da pandemia na educação, a realidade é desafiadora para qualquer homem público que pense no futuro do Brasil. A pesquisa revela, por exemplo, que em todo o Brasil 9 em cada 10 escolas, (90,1%) não retornaram ao ensino presencial em 2020. Enquanto no ensino privado 70,9% das escolas ficaram fechadas em 2020, na rede pública esse número é ainda maior, 98,4% das instituições federais, 97,5% das municipais e 85,9% das estaduais. Sem dúvida, as dificuldades em relação à universalização da educação ficaram ainda mais evidentes com a pandemia, que acentuou a diferença de oportunidades entre os estudantes. Mas, no mundo todo, a educação é um desafio pós-pandemia. A tecnologia aliada ao ambiente escolar hoje é imprescindível e o grande desafio para corrigir distorções e potencializar o interesse e o aprendizado dos alunos.
GBNEWS – As escolas urbanas e rurais também apresentaram desigualdades de acesso à tecnologia?
Comte Bittencourt – Sim, ao analisar o recente estudo do INEP podemos concluir que o ensino remoto ampliou diferenças regionais entre o centro urbano e o interior. As escolas distantes e com dificuldades para ter acesso a internet fizeram com que crianças de áreas rurais sofressem mais os impactos causados pela pandemia do que os estudantes em áreas urbanas. Ainda, segundo esta mesma pesquisa, em nível nacional, cerca de dois milhões de alunos de escolas rurais passaram 2020 em casa e sem acesso à internet. No entanto, mesmo assim, verificamos ao longo dos anos que no interior, principalmente em função do vínculo forte entre a escola e a comunidade, há uma melhor qualidade do ensino público. Mas é preciso dizer que os municípios distantes das regiões metropolitanas enfrentam maior dificuldade na formação continuada de seus profissionais, muito em função da falta de investimentos para esta finalidade. No meu período à frente da Secretaria Estadual de Educação (Seeduc), realizamos o Programa Rio + Alfabetizado, que custeou curso de especialização para professores alfabetizadores de todos os municípios fluminenses. Através do letramento, vamos melhorar o percurso inteiro do aluno.
GBNEWS – O Senhor foi nomeado em setembro de 2020 secretário de Educação do Rio de Janeiro, exatamente, num dos períodos mais difíceis da pandemia com longas quarentenas e só deixou o cargo em junho de 2021. O que destacaria em sua gestão que durou um pouco mais de 8 meses?
Comte Bittencourt – Enquanto estive na Seeduc, busquei fazer o máximo para enfrentar a desigualdade. Em conjunto com uma equipe dedicada, composta majoritariamente por funcionários públicos concursados, aprovamos um planejamento estratégico de educação para o estado. A principal meta foi a implantação do ensino híbrido, presencial e à distância durante a pandemia. A primeira condição básica foi conseguir levar internet aos estudantes e garantir uma conexão de qualidade. A grande maioria dos estudantes da rede pública estadual não tem acesso à internet de qualidade sem limite de dados. Por isso, negociamos com as quatro principais operadoras de telefonia e oferecemos um “link patrocinado”, conectividade gratuita garantida para acessar os conteúdos educacionais desenvolvidos pela Seeduc. Para servir como porta de entrada para o ensino remoto oferecemos o “Aplique-se”, um aplicativo próprio desenvolvido pelos nossos valorosos servidores públicos da rede estadual de ensino.
GBNEWS – Mas, e os profissionais da educação que também estavam sem condições de adquirir ferramentas para desenvolver o próprio trabalho remoto. O que foi feito em sua gestão? Comte Bittencourt – Além de conexão garantida e conteúdo adequado, criamos condições para que os próprios profissionais de ensino pudessem investir em tecnologia e participar ativamente deste novo desafio pedagógico. Após uma longa negociação, conseguimos viabilizar junto ao governo do Estado o investimento de R$ 72 milhões para o pagamento do “auxílio tecnológico”, um benefício para 48 mil profissionais da rede estadual de ensino público, que receberam, em cota única, o valor de R$1.500,00, através de folha suplementar de junho.
GBNEWS – Depois da experiência no Executivo, qual a sua visão sobre a educação pública no estado do Rio? Comte Bittencourt – Temos escolas públicas tão boas quanto as boas escolas particulares. Temos excelentes profissionais e recursos constitucionais garantidos. Com um bom planejamento de médio prazo e uma gestão eficiente, a escola pública não fica devendo em qualidade para nenhuma boa escola privada. GBNEWS – Para finalizar o que o senhor acredita que seja essencial para a educação brasileira poder ter um futuro mais promissor e atender as necessidades dos estudantes?
Comte Bittencourt – A educação precisa ser preservada de acordos políticos e encarada como uma pasta de interesse público prioritário, tendo sua composição garantida por profissionais especialistas na área e majoritariamente concursados. O planejamento deve ser feito para além do período de um mandato, pois todos sabemos que em quatro anos é impossível reverter a atual situação. É urgente encararmos a educação como política de Estado, não de Governo. Essa pasta merece ser blindada contra interesses eleitoreiro.