RIO – Em pleno auge do verão, o projeto Climatizar, que prometia resolver o problema do calor nas escolas da rede estadual com a instalação de aparelhos de ar-condicionado, dá sinais de que ainda não esquentou. Colégios em bairros como Bangu, na Zona Oeste, região que costuma registrar as temperaturas mais altas do Rio, continuam sem os aparelhos. E mais: uma inspeção realizada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) em 2010 apontou indícios de irregularidades. Um dos principais problemas, relatado no voto assinado pelo conselheiro Aloysio Neves, foi a alteração do fornecimento de aparelhos com o selo energético Procel A – conforme determinado no edital do projeto – para o selo D. O voto, que passou pelo plenário do TCE, diz que “o fato ensejará maior consumo com energia elétrica para o Estado do Rio”.
Empresa recebeu R$ 18 milhões em 2010
Para o projeto Climatizar, o estado contratou, através de pregão eletrônico, a Bello Rio Engenharia e Serviços, que ficou responsável pelo aluguel e manutenção dos aparelhos. Dados levantados pelo gabinete do deputado Comte Bittencourt (PPS), presidente da Comissão de Educação da Alerj, no Sistema Integrado de Administração Financeira para Estados e Municípios (Siafem), revelam que a empresa recebeu do estado no ano passado R$ 18,1 milhões.
De acordo com a inspeção do TCE, o contrato com a Bello Rio previa o fornecimento de 2.044 aparelhos do tipo reversível, de 18 mil BTUs. Esse tipo de ar-condicionado deveria ter o selo A, seguindo o que determinava o edital. Mas o tribunal aponta a mudança para o D. Outro problema apontado pelo órgão é relativo à conservação. O voto pede explicações para o fato de “a empresa Bellorio não estar executando a rotina de manutenção prevista no Anexo IX do pregão eletrônico 012/2009, sem receber qualquer advertência por parte da Secretaria (de Educação)”.
Outro indício de irregularidade levantado foi a “locação de ar-condicionados para o Programa Climatizar sem que as unidades escolares já estivessem em condições de utilizá-los, gerando prejuízo para o Estado”. O voto foi dado em outubro do ano passado e o processo está em fase de defesa.
A Bello Rio informou através de sua assessoria de imprensa que “foi solicitada pela Secretaria de Educação a entrega de equipamentos reversíveis, que são superiores, para o atendimento à Região Serrana”. Segundo a empresa, “são equipamentos com ociosidade reduzida, pois no inverno funcionam como aquecedores, propiciando conforto aos alunos destas localidades e, na época, a única companhia que fabricava aparelhos reversíveis com selo Procel A no Brasil não tinha disponibilidade para a entrega do equipamento”. A Bello Rio completa alegando que “na ocasião, entramos em contato com a secretaria explicando o fato e apresentando a carta do fabricante relatando o problema, que não tinha previsão de solução e a decisão foi para não paralisar o projeto”.
Apesar da implementação do Climatizar, os alunos da rede estadual ainda sofrem com as altas temperaturas. No Colégio Estadual Leopoldina da Silveira, em Bangu, há apenas ventiladores nas salas de aula. Alguns estão quebrados e é preciso apelar para “gambiarras” para eles funcionarem. Além disso, as salas de aula estão lotadas. Alunos do 3º ano do ensino médio, Sérgio Luan e Geovane Barbosa dizem que a situação beira o insuportável.
– Na minha sala, tem cerca de 45 alunos e só há ventiladores na frente. Quem fica atrás morre de calor, o vento não chega. Além de tudo, quando os aparelhos estão ligados, fica muito difícil ouvir o que o professor está falando – diz Sérgio.
Um levantamento da Comissão de Educação da Alerj mostra que há na Zona Oeste ao menos outras duas escolas sem ar-condicionado: Colégio Madre Teresa de Cacutá, em Realengo, e Colégio Estadual Bangu. Apesar de o edital do Climatizar ter previsto que nenhuma unidade deveria ficar sem os aparelhos funcionando em casos de manutenção, a comissão levantou casos em que metade dos equipamentos não estaria funcionando desde o ano passado, como no Ciep Pablo Neruda, em São Gonçalo.
A Bello Rio negou problemas com a manutenção, que alegou vir sendo prestada regularmente: “No Verão, ocorre um aumento no número de chamadas, muito em função de picos de energia que ora desarmam compressores, ora queimam os aparelhos, mas esse problema está sendo gerido com eficiência pela empresa, com a cooperação da secretaria”.
Secretaria diz que 906 escolas têm ar
De acordo com a assessoria de imprensa da Secretaria de Educação, “a rede estadual de ensino possui 1457 unidades escolares, sendo 906 escolas com ar-condicionado. São, ao todo, 24.880 aparelhos de ar, uma média de 27 por colégio. Sem considerar as compartilhadas (prédios usados pelo estado que pertencem à rede municipal do Rio), 76% da rede estão climatizadas. Considerando as compartilhadas, 62%”.
Sobre os problemas levantados pelo TCE, a secretaria informou que “abriu processo interno para conferir as condições do contrato (com a Bello Rio). Foram adotados, segundo o órgão, vários procedimentos como um sistema de certificação para que cada escola pudesse explicitar as condições dos aparelhos, que ficará pronto na primeira semana de março. Também já foram enviados, de acordo com a secretaria, quatro ofícios à empresa, desde janeiro, cobrando algumas informações e informando sobre novos procedimentos exigidos e o relatório de visitas de manutenção. “O que não for certificado, será reduzido do valor”, diz a secretaria.
Sobre a falta de ar-condicionado em algumas escolas, o órgão alega que 275 entrarão na segunda fase do Climatizar. Em relação aos problemas de manutenção, “a equipe que está em campo fazendo o levantamento trabalhará para resolver os problemas”.
Ruben Berta
O Globo e Extra